sábado, 13 de novembro de 2010

"Vale Tudo" 22 anos depois: divertida, politicamente incorreta, mas boba, diz Uol

"Vale Tudo" 22 anos depois: divertida, politicamente incorreta, mas boba
MAURICIO STYCER
Crítico do UOL

Odete Roitman (Beatriz Segall) chega à novela "Vale Tudo" para estragar a vida de sua irmã Celina (Nathalia Timberg) e de todos os outros personagens.Exibida entre maio de 1988 e janeiro do ano seguinte, na Globo, a novela “Vale Tudo” foi reapresentada entre maio e novembro de 1992 na sessão “Vale a Pena Ver de Novo” e ganhou uma versão para o mercado “hispânico”, nos EUA, em 2002.
De volta à telinha, pelas mãos do canal Viva, da Globosat, “Vale Tudo” está obtendo bons índices de audiência na TV paga, o que não significa muita coisa, causando um certo frisson nas redes sociais, em especial o Twitter, e animando conversas na madrugada –a novela é exibida à 0h45 e reapresentada às 12h.
Resisti até a noite de quinta-feira, dia da exibição do 29º capítulo da trama. Conforme largamente anunciado, o capítulo assinala a entrada em cena de Odete Roitman, a víbora construída com notável talento por Beatriz Segall.
Odete Roitman (Beatriz Segall) chega à novela Vale Tudo para estragar a vida de sua irmã Celina (Nathalia Timberg) e de todos os outros personagens.
Sua primeira fala é: “Reserve uma suíte presidencial num desses hotéis limpinhos, de preferência que não tenha mendigos na porta tentando agarrar a gente”, recomenda à irmã, Celina, vivida por Nathália Timberg.
O capítulo todo gira em torno “da chegada da fera”, como diz uma personagem sobre Odete, que está no exterior. Todos a temem. Seus filhos, conhecidos e funcionários. Apenas um, Marco Aurélio (Reginaldo Farias), o vice-presidente, parece tranquilo. É um canalha simpático, um tipo irresistível em novelas.
Maria de Fátima (Gloria Pires), a vilã inescrupulosa, que passou por cima da própria mãe, Raquel (Regina Duarte), ainda está dando os primeiros passos na maldade, aproximando-se de Afonso (Cassio Gabus Mendes), filho de Odete.
Divulgação
Afonso (Cassio Gabus Mendes) e Maria de Fátima (Glória Pires) de "Vale Tudo" (1989)
Maria de Fátima diz a Afonso que Odete parece ser uma mulher moderna, ao que o rapaz responde: “Pode ser com os outros, mas comigo e com a minha irmã é Tradição, Família e Propriedade”.
A chegada da mãe perturba Heleninha (Renata Sorrah), a irmã, que tem uma recaída em seu esforço de superar o alcoolismo na última cena do capítulo. Odete está criticando Celina por ter trocado móveis e estofados da casa, quando Heleninha aparece e diz, com um copo de uísque na mão e a língua enrolada: “Ou você acha que neste mundo não tem lugar para a beleza?”
Divulgação
Odete Roitman (Beatriz Segall), Maria de Fátima (Glória Pires), Marco Aurélio (Reginaldo Faria) e Heleninha Roitman (Renata Sorrah) de "Vale Tudo" (1989)
Odete, Maria de Fátima, Marco Aurélio e Heleninha são, de fato, grandes personagens interpretados por ótimos atores. Mas será que justificam a fama de “Vale Tudo”? A novela também entrou para o imaginário por causa do mistério em torno do assassinato de Odete, embora o crime tenha ocorrido faltando apenas 12 capítulos para terminar a trama.
Além do mistério e do carisma de seus vilões, outro ponto marcante de “Vale Tudo” é a música-tema, “Brasil”, de Cazuza, Nilo Roméro e George Israel, na versão de Gal Costa, cujos versos falam: “Brasil / Mostra a tua cara / Quero ver quem paga / Pra gente ficar assim / Brasil / Qual é o teu negócio? / O nome do teu sócio? / Confia em mim”.
Gilberto Braga conta que “Vale Tudo” surgiu de uma discussão familiar, no meio de um jantar. Seu padrinho, irmão de sua mãe, delegado de polícia, foi chamado de “medíocre e babaca” por um parente. “Ah, ele foi delegado em Foz do Iguaçu e Belém e poderia estar rico. Todo mundo que foi delegado nestes lugares tem apartamento na Vieira Souto e ele não tem nada, é pobre”. Diz o novelista, no livro “Autores – História da Teledramaturgia”
:Ana Carolina Fernandes/Folhapress
O dramaturgo Gilberto Braga
“Vale Tudo nasceu dessa discussão, da figura do meu padrinho e da distorção –presente em praticamente todo o país– dos que acham que quem não é corrupto é babaca. Foi a única novela em que, antes de ter a história, eu já tinha a temática. Eu queria fazer uma novela sobre o seguinte assunto: “Vale a pena ser honesto num país onde todo mundo é desonesto?” Foi uma novela muito didática.
O depoimento ajuda a entender o que não gostei ao rever o capítulo 29 de “Vale Tudo”. É uma novela destinada a vender uma “mensagem” de cunho moral, escrita didaticamente. Gilberto Braga acreditava que, na exposição exagerada da maldade de seus personagens, estaria dando uma lição ao público. Isso inclui até na famosa “banana” que o vilão Marco Aurélio dá no final da novela, ao escapar impune.
Vista hoje, “Vale Tudo” me pareceu engraçada e divertida, mas boba. É politicamente incorreta, mas esta qualidade fica em segundo plano diante dos exageros cometidos e ditos para chamar a atenção do público.
Gilberto Braga minimiza repercussão
Gilberto Braga, que completa 65 anos de idade nesta segunda (1º), anda surpreso com o sucesso da reprise de “Vale Tudo”, de 1988, que escreveu ao lado de Aguinaldo Silva e Leonor Bassères. A reapresentação da novela, desde o dia 4 de outubro, tem garantido a liderança de audiência na TV paga ao canal de reprises Viva.
Autor de outros ícones da teledramaturgia brasileira como “Escrava Isaura”, "Dancin' Days", “Anos Dourados”, “Anos Rebeldes” e "Celebridade", Gilberto minimiza o atual "fenômeno": “tanta repercussão para uma reprise", declarou, por e-mail, à reportagem do UOL.
"Vale Tudo", de 1988, foi escrita por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères e dirigida por Dennis Carvalho e Ricardo Waddington. Com Regina Duarte, Antônio Fagundes, Beatriz Segall, Glória Pires e Carlos Alberto Riccelli nos papéis principais, a trama abordou, segundo Gilberto Braga, "até que ponto valia ser honesto no Brasil" na época de sua exibição "Vale Tudo" também não está entre suas obras favoritas. O autor elege duas minisséries como seus melhores trabalhos. “Sinto orgulho de ‘Anos Dourados’ e ‘Anos Rebeldes’”, diz, acrescentando que tem vontade de escrever outro produto do gênero. “Espero voltar a fazer minissérie muito breve”, torce.
Embora saiba da importância de suas obras para a TV, Gilberto entrega que, se pudesse, reescreveria a novela “Brilhante”, estrelada por Tarcísio Meira e Vera Fischer em 1981. “Faria sem censura”, revela.
No momento, Gilberto está focado no roteiro de “Insensato Coração”. Ambientada em Florianópolis, Santa Catarina, que o autor considera de "bom astral, como várias outras do Brasil”, a novela vai substituir “Passione” na Globo a partir de janeiro de 2011.Para dirigir seu próximo trabalho, Gilberto convidou, mais uma vez, Dennis Carvalho. “Admiro o Dennis e ele me admira. Nos gostamos. Quando ele quer A e quero B, escolhemos um C”, explica o autor sobre como resolve as diferenças de opinião com o diretor.
Há 37 anos atuando como teledramaturgo, Gilberto acredita que a TV ainda é o maior meio de entretenimento brasileiro. Ainda que muita gente acompanhe as novelas pela internet, para o autor, a web não vai substituir a TV. “Espero que isso não aconteça, porque a imagem da TV está tão boa!”, brinca.

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